Por Dentro da Conta de Luz: Os Segredos da Tarifação Energética
A inspiração para este post surgiu durante uma conversa com um colega, quando refletimos sobre um papel importante das concessionárias que, muitas vezes, passa despercebido: sua função como agentes arrecadadores para toda a cadeia de fornecimento de energia. Exploraremos, em seguida, como isso ocorre na prática. Vamos também abordar as origens das receitas das concessionárias, discutindo como a Base de Remuneração impacta diretamente a conta de energia do consumidor. Como essa remuneração é aplicada na prática? Vamos descobrir juntos.
As concessionárias de energia elétrica desempenham um papel
essencial que vai além da distribuição de energia: elas atuam como
intermediárias financeiras em toda a cadeia de fornecimento. Quando alguém paga
sua conta de energia, esse valor não fica inteiramente com a concessionária. Uma
parte significativa dessa receita é destinada a outros agentes do setor, como
geradoras, transmissoras e ao próprio governo, por meio de tributos e encargos.
Esse método de arrecadação, apesar de eficiente sob a ótica do agente
regulador, pode causar uma visão distorcida para o consumidor, que pode julgar
que o valor cobrado pela energia consumida é precificado pela concessionária.
As concessionárias ficam com apenas uma fração desse
montante para cobrir seus próprios custos operacionais e garantir o retorno
sobre os investimentos realizados em infraestrutura e manutenção. Isso
significa que, embora sejam o ponto de contato direto com o consumidor, elas
operam dentro de um sistema complexo de repasses que garante a sustentação de
todo o setor elétrico.
Esses repasses incluem valores destinados ao pagamento pela
energia gerada, pelo uso da rede de transmissão e pela cobertura de encargos
setoriais, como os subsídios aplicados a programas sociais e energias
renováveis. Portanto, o valor efetivo que permanece com a concessionária é
apenas uma parcela do total arrecadado, refletindo o custo de manter a
distribuição de energia de forma eficiente e dentro das normas regulatórias.
Nos últimos estudos realizados, podemos assumir que, em média, as contas de energia
elétrica são divididas em Geração 35%, Transmissão 5%, Encargos 40% e
Distribuição 20%. Importante salientar que essa divisão pode variar
ligeiramente conforme a região e outros fatores específicos.
Cada um desses componentes representa uma parte fundamental
do sistema elétrico:
·
Geração: A geração de energia elétrica é
a etapa inicial do processo e envolve empresas que produzem eletricidade a
partir de diversas fontes, como hidrelétricas, termelétricas, eólicas e
solares. No Brasil, grandes geradoras como a Itaipu Binacional, Eletrobras, e
empresas privadas como a Engie são responsáveis por essa função.
·
Transmissão: Após a geração, a energia
precisa ser transportada das usinas até as redes de distribuição, um processo
conhecido como transmissão. Essa etapa é conduzida por empresas especializadas,
como a Taesa e a ISA CTEEP, que operam as linhas de transmissão de alta tensão.
O custo da transmissão é repassado ao consumidor final e inclui a manutenção e
operação das linhas de transmissão.
·
Encargos: Essa parte da conta de energia
inclui uma série de tributos e encargos que são destinados ao governo e ao
financiamento de políticas públicas. Entre os tributos mais comuns estão o
ICMS, o PIS/Pasep, e a COFINS, que incidem sobre toda a cadeia produtiva da
energia elétrica. Os encargos setoriais, como a CDE, a Conta de Consumo de
Combustíveis (CCC) para subsidiar a geração em sistemas isolados, e a Tarifa
Social de Energia Elétrica (TSEE), que oferece descontos para famílias de baixa
renda, são exemplos de programas governamentais financiados por essa parcela da
conta.
·
Distribuição: A distribuição é a etapa
final, quando a energia é entregue ao consumidor final. As concessionárias de
distribuição, como a Equatorial Energia, Enel e CPFL, são responsáveis por essa
função. Elas lidam com a operação, manutenção, e expansão das redes de
distribuição para garantir que a energia chegue com qualidade e confiabilidade
às residências e empresas. A parcela destinada à distribuição cobre esses
custos operacionais e garante o retorno sobre os investimentos feitos pelas
concessionárias na infraestrutura de distribuição. Além disso, tributos como o
ISS (Imposto sobre Serviços) podem incidir sobre os serviços prestados pelas
distribuidoras.
Agora que já discutimos a composição da conta de energia
elétrica, é fundamental entender como a tarifa de energia é calculada, seguindo
um processo regulatório rigoroso e detalhado.
A tarifa é segregada em duas frentes principais: Parcela A e
Parcela B. A “Parcela A” é composta pelos custos de Geração, Transmissão e
Encargos Setoriais, que são custos não gerenciáveis pela concessionária de
distribuição. Esses custos são repassados em sua integralidade aos
consumidores, interferência para variações controladas pela concessionária. Em
outras palavras, são custos que a distribuidora apenas repassa, sem gestão
direta.
Já a "Parcela B" refere-se aos custos gerenciáveis pela concessionária,
cobrindo despesas operacionais, de manutenção e de investimentos na
distribuição. É nesta parcela que se encontra a remuneração da concessionária
pelos serviços prestados. A Parcela B, portanto, é onde a concessionária pode
aplicar sua gestão para garantir eficiência e qualidade na prestação de
serviços.
Dentro da Parcela B, existem componentes específicos que
determinam a remuneração da concessionária:
Base de Remuneração Regulatória Líquida (BRRL) e Receita
de Capital (RC): A BRRL representa o valor dos ativos que compõem o serviço
de distribuição, descontada a depreciação acumulada e outras deduções. A RC é a
remuneração obtida pela concessionária, calculada como a BRRL multiplicada pelo
WACC (Custo Médio Ponderado de Capital) regulatório, garantindo um retorno
sobre os investimentos realizados. Sua função então é efetivamente remunerar o
detentor da concessão dos investimentos realizados.
Base de Remuneração Regulatória Bruta (BRRB) e Quota de
Reintegração Regulatória (QRR): A BRRB é o valor bruto dos ativos deduzido
dos bens totalmente depreciados, ativos oriundos de obrigações especiais brutas
e do valor não aproveitado (IAI). A QRR, por sua vez, reflete a depreciação
desses ativos ao longo do tempo, influenciando diretamente o valor da tarifa
que os consumidores pagam. Para calcular a QRR multiplica-se o valor da BRRB
pela Taxa Média de depreciação dos ativos. A QRR possui como objetivo restituir
a concessão da depreciação dos ativos, garantindo assim a perenidade dos
equipamentos e a prestação contínua dos serviços.
Base de Anuidades Regulatórias (BAR) e Custo Médio
Incremental Anualizado (CAIMI): A BAR inclui ativos que não são elétricos,
como softwares, edifícios administrativos e veículos, e é calculada de forma
diferenciada. O CAIMI é o custo anualizado desses ativos, que influencia a
remuneração que a concessionária recebe.
Obrigações Especiais (OEs) e Remuneração das OEs: As
OEs Ativos que possuem sua origem financeira não vinculada à concessionária ou
ainda investimentos específicos que a concessionária realiza, como expansão de
redes ou projetos especiais, com recursos específicos de programas
governamentais como o PLPT – Programa Luz para Todos. Estes recursos são
deduzidos das Bases de Remuneração (Brutas e Líquidas) e são remunerados via
Remuneração de Oes.
Compreender esses componentes ajuda a desvendar o cálculo
das tarifas de energia, refletindo a complexidade do setor elétrico e a
importância da regulação para equilibrar os interesses das concessionárias e
dos consumidores.
A complexidade da estrutura de tarifação da energia elétrica
no Brasil é elevada e detalhada, envolvendo agentes que atuam desde a geração
até a distribuição chegando, no final, ao consumidor. Compreender esses
elementos é fundamental para qualquer profissional do setor e para os
consumidores que buscam entender melhor suas contas de energia. Este artigo oferece
uma visão geral dos processos e critérios que determinam essas tarifas. Encerro
aqui convidando todos a compartilhar suas perspectivas e a contribuir com
informações adicionais que possam enriquecer ainda mais essa discussão. Juntos,
podemos aprofundar nosso entendimento sobre o setor e encontrar novas formas de
garantir eficiência e transparência na gestão da energia elétrica.
Excelente artigo, quando falamos de tarifa de energia sempre temos a distribuição como o vilão por ser a que está em contato direto conosco. A explicação deixa claro o papel de cada membro e onde de fato a composição da tarifa age. Obrigado por compartilhar.
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