Laudos e Fiscalizações Anuais: O Futuro da Gestão de Ativos Já Começou
Escrever aqui no BRR em Foco é um desafio diário, pois tornar um tema tão específico e complexo como a Gestão de Ativos interessante não é simples. Porém, o blog ganhou ainda mais força com a presença de grandes profissionais do setor, trazendo visões valiosas sobre inovação, fiscalização e regulação. As conversas com o Filipe Dias e com o Tomaselli foram um marco nesta minha jornada. Em breve, seguiremos com novos blocos de entrevistas, e deixo aqui meu agradecimento aos amigos que toparam esse papo.
Mas antes disso, quero compartilhar com vocês um tema que
vem gerando uma grande movimentação setorial devido à sua relevância e que
merece nossa atenção: as Fiscalizações Anuais da ANEEL. Antes se demonstrando
mais focadas na BRR, essas fiscalizações estão passando por uma reformulação e
a ANEEL caminha para um modelo mais abrangente, que validará integralmente a
governança financeira e patrimonial das concessionárias. O objetivo é garantir
maior rastreabilidade, transparência e conformidade regulatória e contábil.
Diante dessa mudança inevitável, e como gestor de ativos e
BRR, quero apresentar um processo que, em minha trajetória profissional, tem se
mostrado fundamental para uma gestão mais eficiente da BRR: a adoção de laudos
anuais como ferramenta de controle, ajuste e preparação. Essa prática não
apenas aumenta a previsibilidade da Base de Remuneração Regulatória, mas também
atua como um mecanismo estratégico para correção de inconsistências e
alinhamento aos processos de fiscalização da ANEEL.
Nos próximos tópicos, vou explorar como os laudos anuais
podem elevar a gestão da BRR a um novo patamar e como essa abordagem se conecta
diretamente com as novas diretrizes da ANEEL. Vamos nessa?
Para começar, precisamos entender que as fiscalizações
anuais da ANEEL são um tema que há anos circula nos corredores da agência como
um avanço natural na fiscalização econômico-financeira das distribuidoras. No
entanto, as limitações de tempo e custo sempre foram barreiras para sua
implementação efetiva. Agora, com o avanço tecnológico e a crescente automação
dos processos regulatórios, esse cenário começa a mudar.
A utilização massiva do Bulldozer nos processos de
fiscalização da BRR e os aprimoramentos na CVA possibilitam uma validação e
análise de dados em larga escala, reduzindo significativamente o tempo de
análise manual. Com isso, a ANEEL ganha condições de ampliar sua atuação
fiscalizatória, mantendo o foco na transparência e rastreabilidade das
informações.
A grande dúvida que surge é: como essas fiscalizações
funcionarão na prática? A base principal para essa análise será composta pelos
dados previstos no Manual de Dados da ANEEL, cruzados com informações da
Base de Dados Geográfica das Distribuidoras (BDGD) e dos Speds
Contábeis (ECDs). Esse cruzamento permitirá que a agência avalie um volume
extenso de informações, abrangendo diversos processos essenciais.
Essa abordagem já vem sendo sinalizada pela própria ANEEL.
No ENCONSEL 2023, Ziumar Nazareno (SFF-ANEEL) mencionou como os ECDs
poderiam ser a peça-chave para essa evolução. Em 2024, o tema retornou
com mais detalhes, consolidando a ideia de uma fiscalização patrimonial
contínua e automatizada.
E esse tal de ECD? A Escrituração Contábil Digital
(ECD) é um dos pilares do SPED e representa a digitalização completa
dos registros contábeis das empresas. Ele contém uma série de blocos que
organizam e estruturam as informações financeiras e patrimoniais. Entre eles,
os blocos I200 e I250 merecem destaque.
Bloco I200 – Registra os lançamentos contábeis
individuais, detalhando cada movimentação ocorrida na empresa. Esse bloco
contém dados como:
- Número
do lançamento
- Data
do lançamento
- Histórico
contábil (descrição do evento)
- Conta
contábil de débito e crédito
- Valor
movimentado
Cada linha do I200 representa um lançamento contábil
específico dentro do período de apuração.
Bloco I250 – Complementa o I200, detalhando as
partidas contábeis de cada lançamento. Ou seja, para cada lançamento registrado
no I200, o I250 apresenta as contas envolvidas na movimentação,
seguindo o princípio da partida dobrada (débito e crédito). Ele contém
informações como:
- Código
da conta contábil
- Valor
da movimentação
- Indicador
de natureza (débito ou crédito)
Podemos compreender então que o I200 é o livro Razão das
contas e o I250 é o desdobramento detalhado das movimentações dentro desse
Razão.
Apesar dos avanços, há desafios e questões que ainda
precisam ser respondidas. O primeiro ponto é a segurança
jurídico-regulatória, já que o processo de fiscalização anual ainda não
está claramente detalhado nas normativas. Além disso, há um impacto tarifário a
ser considerado na Parcela B, pois as regras contratuais atuais não
preveem a inclusão de custos adicionais para fiscalizações anuais dessa
magnitude.
Outro ponto de incerteza envolve os critérios de seleção das
concessionárias. Ainda não está claro quais empresas serão fiscalizadas
primeiro, quais critérios serão aplicados e como esse processo será estruturado
para concessionárias com diferentes níveis de maturidade na gestão patrimonial.
Neste cenário, as equipes de Gestão de Ativos e BRR
podem assumir um papel ainda mais estratégico. Como já lidam diretamente com
fiscalizações regulatórias e ferramentas automatizadas, como o Bulldozer,
esses profissionais possuem um conhecimento profundo dos desafios e soluções
necessárias para garantir que a governança patrimonial esteja preparada para
essa nova realidade.
O desenvolvimento de laudos anuais é uma ferramenta de
grande importância para a gestão eficiente e estratégica da Base de Remuneração
Regulatória (BRR). Trata-se de Laudos de avaliação desenvolvidos por empresas
credenciadas pela ANEEL, mas com um diferencial importante: são destinados
exclusivamente ao uso interno das concessionárias, sem necessidade de protocolo
ou envio à agência reguladora.
Diferente dos laudos realizados nos ciclos tarifários, que
possuem caráter obrigatório e impacto direto na revisão tarifária, os laudos
anuais oferecem uma resposta mais simples, ágil e estratégica, permitindo que
as empresas façam correções de processos antes das fiscalizações oficiais.
Mudando o foco do Time de BRR, parando de apagar incêndios e começando a
preveni-los.
O primeiro e mais evidente benefício dos laudos anuais é que
eles forçam a concessionária a estruturar suas informações no formato do Manual
de Dados da ANEEL, garantindo que os processos internos estejam alinhados com
as exigências regulatórias.
Além disso, esses laudos geram ganho de maturidade nos
processos internos, uma vez que permitem que as equipes envolvidas se
familiarizem melhor com a construção dos laudos, o atendimento a demandas
regulatórias e os desafios metodológicos relacionados. Essa experiência prática
reduz o risco de inconsistências e retrabalho durante a revisão tarifária,
tornando todo o processo mais eficiente e preciso.
A primeira aplicação dos laudos anuais é óbvia: determinar o
valor atualizado da BRR sem precisar esperar o ciclo tarifário completo. Isso
permite às concessionárias uma visão mais clara de sua base de ativos,
possibilitando ajustes estratégicos com antecedência.
Mas os benefícios vão além. Os laudos também contribuem
para:
.
Aumentar a acuracidade das projeções BRL e melhorar o
planejamento financeiro.
.
Identificar desvios processuais que podem estar impactando a
valoração da BRR.
.
Detectar erros de alocação de CAPEX e OPEX, garantindo um
direcionamento mais eficiente dos investimentos.
Mas é só isso? Os laudos anuais também permitem análises
mais complexas e inovadoras, que vão além da simples valoração da BRR:
. Análise detalhada da Relação
VNR / VOCa → Relação percentual entre o valor a ser reconhecido pela ANEEL
(VNR) frente ao valor original contábil atualizado gasto pela concessionária
(VOCa). Isso evidencia distorções e garante que os ativos sejam remunerados de
forma adequada.
. Impacto do Banco de Preços
Referenciais (BPR) → Compreender como a precificação impacta na avaliação
da BRR e se há defasagens na base da ANEEL que possam afetar a remuneração da
empresa.
. Gestão de Obrigações
Especiais (OE) → Avaliar como os investimentos financiados por terceiros
impactam na remuneração das concessionárias e quais estratégias podem ser
adotadas para otimizar esse efeito.
. Fluxo de Obras e Definição
de Investimentos → Os laudos ajudam a otimizar a alavancagem financeira da
BRR, garantindo que os investimentos sejam feitos de maneira mais estratégica,
maximizando a remuneração do capital investido e, ao mesmo tempo, garantindo a
melhoria da qualidade do serviço prestado.
Aqui entra um ponto fundamental: as equipes de BRR devem ter
um papel estratégico nesse movimento. Por atuarem diretamente com as
fiscalizações regulatórias e ferramentas como o Bulldozer, esses profissionais
possuem a expertise necessária para transformar os laudos anuais em ferramentas
de inteligência regulatória e financeira.
Além de toda essa parte técnica, o futuro da regulação exige
equipes multidisciplinares, que combinem conhecimentos técnicos, financeiros e
regulatórios para interpretar os dados com profundidade. Já falei sobre esse
conceito no meu artigo Desbravando a Cauda Longa do Conhecimento, onde
discuto como os profissionais do setor precisam expandir suas competências para
agregar ainda mais valor às concessionárias.
Agora é importante amarrar toda essa discussão com um ponto
central: os laudos anuais não apenas melhoram a gestão da BRR, mas também
preparam as concessionárias para as novas fiscalizações anuais da ANEEL.
A tendência de fiscalizações mais frequentes e baseadas em
análise massiva de dados (BDGD, ECDs, Manual de Dados) exige que as empresas
estejam sempre prontas para atender às exigências da agência. A concessionária
que espera a fiscalização para corrigir seus processos já está atrasada.
Ao adotar os laudos anuais como ferramenta de controle
contínuo, as distribuidoras não apenas se antecipam às exigências regulatórias,
mas também garantem uma gestão patrimonial mais eficiente, transparente e
alinhada às melhores práticas do setor.
A proximidade da implementação de fiscalizações anuais
da ANEEL representa um marco importante na busca por maior rastreabilidade,
transparência e eficiência regulatória. A digitalização e automação dos
processos permitem que a agência fiscalize um volume de dados cada vez maior,
transformando a forma como a gestão financeira e patrimonial das distribuidoras
é analisada.
Nesse cenário, os laudos anuais surgem como uma
ferramenta essencial para antecipação e correção de possíveis inconsistências,
além de prepararem as concessionárias para as novas exigências regulatórias. Ao
alinhar a estrutura de dados internos com os formatos exigidos pela ANEEL, esses
laudos não apenas aumentam a previsibilidade da BRR, como também otimizam a
gestão de investimentos e promovem maior conformidade regulatória.
Mas não basta apenas ferramentas e processos bem definidos.
A gestão eficiente desses novos desafios exige profissionais capacitados,
multidisciplinares e com visão estratégica. As equipes de Gestão de Ativos e
BRR têm um papel fundamental nesse contexto, pois já lidam diretamente com
fiscalizações e processos automatizados como o Bulldozer. O futuro da
regulação exige adaptação, conhecimento aprofundado e, principalmente, uma
atuação proativa na construção de soluções.
Diante de todas essas mudanças, fica a reflexão: como sua
empresa está se preparando para essa nova realidade? Os laudos anuais já
fazem parte da sua estratégia de gestão da BRR? Como podemos aprimorar esse
processo para garantir melhores resultados?
Quero ouvir sua opinião!
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