Laudo de Avaliação 360°: Fundamentos, Ferramentas e Futuro da BRR

 Como já apresentamos aqui em ocasiões anteriores, a Base de Remuneração Regulatória (BRR) desempenha um papel fundamental para garantir o equilíbrio econômico-financeiro das concessionárias do setor elétrico brasileiro. Esta base é responsável por definir os bens utilizados na prestação do serviço público e assegurar que os investimentos necessários para a prestação eficiente de serviço sejam corretamente reconhecidos e remunerados.

 

Assim, o laudo de avaliação é um elemento indispensável. Mais do que um documento técnico, ele agrupa informações sobre os ativos regulatórios, avaliando-os de forma à nortear os processos como as Revisões Tarifárias (RT). Este processo não apenas assegura a precisão dos cálculos que impactam as tarifas de energia, mas também garante a isonomia, redução da discricionariedade e transparência regulatória, um valor fundamental para a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e para a sociedade.


Desenvolvido conforme o Submódulo 2.3 do PRORET, o laudo de avaliação é construído a partir de critérios metodológicos robustos, como o Método do Valor Novo de Reposição (VNR). Além disso, sua elaboração depende de sistemas de dados padronizados, como a SDI 1, que potencializam a eficiência do processo e de sua correta validação.

 

Neste post irei explorar os principais aspectos do laudo de avaliação, as peças que o compõem até os sistemas que lhe dão suporte, destacando sua importância no cenário regulatório. Afinal, compreender o papel do laudo é um passo chave para aqueles que buscam se aprofundar nos mecanismos que regem o setor elétrico brasileiro, que buscam constantemente a modicidade tarifária e a sustentabilidade econômica das concessionárias.

 

O desenvolvimento do laudo de avaliação para a BRR tem uma estrutura rígida, composta por peças que organizam as informações sobre os ativos das concessionárias. Este grupo de informações são necessárias para garantir precisão, transparência e conformidade regulatória, permitindo que a ANEEL e demais agentes setoriais analisem corretamente os valores que compõem a Base.

 

Abaixo eu vou detalhar os principais componentes do laudo, organizados de forma sequencial com o objetivo de tornar a compreensão mais simples:

 

A Base Blindada (BB) contém os ativos que já foram avaliados e homologados pela Aneel em revisões tarifárias anteriores. Seu principal objetivo é atualizar, remunerar e movimentar os ativos dos ciclos anteriores.

 

Principais características da Base Blindada:

·         Inclui ativos previamente reconhecidos pelo órgão regulador, já ajustados conforme suas movimentações (baixas, atualizações monetárias).

·         Sofre ajustes para refletir a depreciação acumulada e eventuais baixas ocorridas entre os ciclos tarifários.

·         Mantém-se "blindada" contra reavaliações, exceto em casos de erros processuais devidamente comprovados ou situações excepcionais como RTEs, fato já discutido em artigos anteriores.

 

A Base Blindada assegura que os investimentos já validados na BRR sejam mantidos sem necessidade de reavaliação periódica, evitando instabilidade e reprocessamentos de avaliações desnecessárias.

 

Diferente da Base Blindada, a Base Incremental (BI) incorpora os novos ativos adquiridos e colocados em operação entre a última revisão tarifária e a revisão atual. Seu objetivo é atualizar a BRR para refletir novos investimentos feitos pela concessionária.

 

Principais características da Base Incremental:

·         Detalhamento dos novos ativos que entraram em operação no período entre revisões tarifárias.

·         Avaliação destes novos ativos utilizando o método do Valor Novo de Reposição (VNR), garantindo que sejam considerados a preços atualizados e de forma compatível com o mercado. Esta avaliação tem um processo específico utilizando diversos métodos também previsto no PRORET, incluindo avaliação por Banco de Preços Referenciais (BPR), Valor Original Contábil Atualizado (VOCa) ou Orçamento Sintético de edificações (OE). 

A Base Incremental permite que a BRR evolua, acompanhando os investimentos necessários para a melhoria e expansão dos serviços de distribuição de energia elétrica.

 

A Conciliação é um processo crítico que verifica a consistência entre os ativos registrados na BRR e aqueles efetivamente contabilizados pela concessionária.

Objetivos da Conciliação:

·         Comparar as informações do laudo e do AIS (ativo Imobilizado em serviço) com os registros contábeis da empresa (Razão de obras), garantindo alinhamento e coerência.

·         Identificar possíveis inconsistências, como ativos que foram desativados, vendidos ou que não possuem suas respectivas origens em obras realizadas.

·         Assegurar que todos os ativos considerados na BRR estejam devidamente documentados e validados.

A conciliação evita distorções nos valores da BRR, buscando assim a confiabilidade no cálculo da remuneração das concessionárias.

 

As Obrigações Especiais (OEs) referem-se a investimentos vinculados a recursos de terceiros, como aqueles financiados por fundos setoriais ou decorrentes de contrapartidas regulatórias.

Características das Obrigações Especiais:

·         Representam valores que não devem ser integralmente remunerados via tarifa, pois foram financiados por fontes externas.

·         São tratadas separadamente no laudo, garantindo que não haja dupla contabilização ou remuneração indevida.

·         Sofrem ajustes ao longo do tempo para refletir sua amortização e eventual baixa patrimonial.

Garantir a constituição e amortização eficiente das Obrigações Especiais é importante para garantir que apenas os ativos pagos pelas concessionárias sejam remunerados na tarifa, protegendo os consumidores de custos indevidos e garantindo modicidade tarifária.

 

O Índice de Aproveitamento (IA) é um parâmetro utilizado para medir a prudência utilização de um ativo dentro da concessão. Nem sempre um ativo opera em sua capacidade total, e o índice de aproveitamento reduz o valor de avaliação reconhecida para refletir essa realidade.

Cálculo e Aplicação do Índice de Aproveitamento:

·         O IA é determinado com base no uso real do ativo, projetando inclusive potenciais crescimentos ou reduções de demanda, podendo ser ajustado caso a concessionária demonstre variações significativas.

·         Se um ativo está subutilizado, seu valor na BRR deve ser reduzido proporcionalmente ao seu aproveitamento efetivo. O processo é valido para os bays de transformação e terrenos de Subestações.

O uso do Índice de Aproveitamento atua para que a BRR seja fidedigna a realidade operacional das empresas, evitando que consumidores paguem por infraestrutura ociosa.

 

O Almoxarifado de Operações (AO) se refere aos itens de estoque fundamentais para prestação de serviços e utilizados na operação das distribuidoras – Componentes Menores (COM) – que também fazem parte da BRR, agregados aos equipamentos principais. O Almoxarifado de Operação trata desses ativos, garantindo que sejam valorados e reconhecidos corretamente.

Principais características do Almoxarifado de Operação:

·         Refere-se unicamente à componentes menores (COMs) fundamentais para a prestação de serviço, sendo que Equipamentos Principais indevidamente registrados nas contas de almoxarifado de operações são saneados pela Aneel.

·         Os valores do almoxarifado devem ser conciliados com os registros contábeis para evitar discrepâncias.

A correta contabilização do Almoxarifado de Operação assegura que os custos fundamentais destes componentes sejam adequadamente reconhecidos na tarifa.

 

Para facilitar a análise e compreensão do laudo, ele inclui quadros resumo e um sumário executivo, que consolidam as principais informações de forma objetiva e acessível.

Função dos Quadros Resumo e do Sumário Executivo:

·         Apresentam os valores finais da Base Blindada, Incremental e outros componentes da BRR.

·         Facilitam a revisão por parte da ANEEL e demais agentes do setor.

·         Garantem transparência e clareza na prestação de contas da concessionária.

Estas peças finais consolidam e tornam o laudo mais compreensível e ajudam à aumentar a eficiência e transparência no processo regulatório.

 

O laudo de avaliação é uma etapa primordial na BRR, organizado em diversas sessões (peças) que buscam constantemente a acuracidade, transparência e conformidade regulatória. Cada item tem um papel específico na organização dos ativos das concessionárias, assegurando que a remuneração seja justa e que os consumidores não paguem por custos indevidos.

 

Na próxima seção, aprofundaremos os sistemas de suporte ao laudo, como a SDI 1, o manual de dados e o Bulldozer, essenciais para garantir a confiabilidade e eficiência desse processo.

 

Após o detalhamento do Laudo de avaliação, acho importante destacar que que este processo necessita de um alto nível de acuracidade e padronização de informações. Buscando garantir a confiabilidade das informações apresentadas e reduzir a subjetividade na avaliação dos ativos das concessionárias, a Agência Reguladora estruturou um conjunto de ferramentas e normativas que sustentam esse processo.

Os principais instrumentos de validação ao laudo são:

  • SDI 1 da ANEEL, que demanda as informações de Ativos, Contabilidade e Regulação das distribuidoras de forma padronizada.
  • Manual de Dados, que estabelece diretrizes para o preenchimento e envio das informações.
  • Bulldozer, uma ferramenta que trouxe avanços significativos na validação dos dados e na qualidade da base de ativos.

 

A SDI 1 (Solicitação de Informações) é um agrupamento de informações iniciais demandada pela Aneel para os processos de Revisão Tarifara (RT), estruturada de forma a permitir à correta validação dos dados presentes no laudo de avaliação. Sua função é padronizar os dados sobre os ativos que compõem a BRR, garantindo maior rastreabilidade e validação.

Importância da SDI 1 para o Laudo de Avaliação:

  • Estabelece um formato único para o envio de informações, reduzindo discrepâncias entre concessionárias.
  • Permite a rastreabilidade dos ativos ao longo dos ciclos tarifários, facilitando a análise regulatória.
  • Serve como base de dados centralizada para a construção do laudo e das análises da ANEEL.

Este grupo de dados que descrevi foi um marco na padronização das informações patrimoniais e na organização dos documentos utilizados na revisão tarifária. Seu uso tornou-se obrigatório para que o laudo de avaliação seja consistente e auditável.

 

A SDI 1 conforme descrito acima é fruto da implementação do Manual de Dados da Aneel que é um documento regulatório que orienta as distribuidoras sobre como preencher e enviar corretamente as informações para a ANEEL. Ele detalha os requisitos técnicos, os critérios de classificação de ativos e as regras para submissão dos dados.

Principais Diretrizes do Manual de Dados:

  • Define os campos obrigatórios para cada informação demandada, como data de aquisição, valor contábil, depreciação e localização.
  • Específica como os ativos devem ser conciliados com a base contábil da empresa.
  • Criar regras para mitigar erros e alavancar a conformidade regulatória.

Seguir as diretrizes do Manual de Dados evitem retrabalho e inconsistências no laudo de avaliação.

 

Por fim destaco que nos últimos anos, a ANEEL implementou a ferramenta Bulldozer, que trouxe um novo nível de automação e rigor na validação das informações patrimoniais. Este processo trouxe:

  • Processamento automatizado: A ferramenta cruza as informações enviadas via SDI 1 com bases de dados regulatórias e contábeis, identificando inconsistências automaticamente.
  • Geração de alertas: Identifica problemas como ativos duplicados, valores incoerentes e erros na classificação patrimonial.
  • Aprimoramento contínuo: A cada ciclo tarifário, o Bulldozer se torna mais eficiente na identificação de erros e inconsistências.

A implementação do Bulldozer aumentou a precisão do laudo de avaliação e reduziu a necessidade de ajustes manuais, tornando a fiscalização mais objetiva e eficiente.

Tenho um post completo sobre o Bulldozer em https://brunosoliveira.blogspot.com/2024/04/revitalizando-regulacao-energetica-as.html

A implementação de ferramentas como SDI 1, Manual de Dados e Bulldozer permitiram, em minha opinião, avanços significativos para a confiabilidade e padronização do laudo de avaliação. Essas iniciativas buscam otimizar a análise da BRR e que ela seja apurada com dados consistentes, em condições que permitam às concessionárias a correta remuneradas e buscam constantemente a modicidade tarifária em benefício do consumidor.

 

Ainda apresentando os principais elementos de suporte do Laudo de Avaliação, A Base de Dados Geográfica da Distribuidora (BDGD) é um dos elementos que são necessários para o acompanhamento dos ativos físicos das distribuidoras de energia elétrica no Brasil. Ela contém informações sobre a base elétrica das concessionárias, permitindo que a ANEEL e os demais agentes do setor monitorem e gerenciem a rede de distribuição de forma eficiente.

No contexto da Base de Remuneração Regulatória (BRR), a BDGD desempenha um papel de fornecer um lastro físico atualizado da rede elétrica, garantindo que os ativos considerados no cálculo tarifário realmente existam e estejam corretamente registrados​.

A BDGD é um sistema de informações espaciais que reúne dados detalhados sobre:

  • Extensão das redes de distribuição (aéreas e subterrâneas).
  • Subestações e equipamentos da rede elétrica.
  • Localização e estrutura dos ativos regulatórios.

Essas informações permitem que a ANEEL possa validar a existência e a localização dos ativos incluídos na BRR.

 

Mais informações da BDGD para BRR em https://brunosoliveira.blogspot.com/2024/05/bdgd-revelada-o-impacto-crucial-na-base.html

 

A BDGD é efetiva para garantir que a BRR seja construída com dados confiáveis e alinhados à realidade da rede elétrica. O cruzamento dessas informações com os registros contábeis e patrimoniais das distribuidoras fortalece a eficiência regulatória, assegurando que os consumidores paguem tarifas justas e compatíveis com os investimentos realizados.

 

Ao longo deste artigo, apresentei informações sobre o laudo de avaliação da Base de Remuneração Regulatória (BRR) e sua relevância para a regulação do setor elétrico. Tive por objetivo explicar como esse documento é fundamental para garantir que as concessionárias sejam remuneradas de forma justa pelos investimentos realizados, mantendo o equilíbrio econômico-financeiro do setor e protegendo os consumidores de custos indevidos.

A estruturação do laudo perpassa peças fundamentais que garantem que apenas ativos efetivamente utilizados sejam considerados na BRR. Além disso, destacamos o papel da BDGD, que se tornou uma ferramenta de validação e rastreabilidade dos ativos físicos.

E agora? Vamos discutir!

A BRR continua evoluindo, com avanços na digitalização dos processos e maior exigência por transparência e eficiência. Se você atua no setor ou tem interesse em entender melhor os impactos desse tema, deixe seu comentário abaixo!

Quais desafios você enxerga na elaboração e validação do laudo de avaliação?
Como a digitalização e o uso de ferramentas como BDGD e Bulldozer podem melhorar o processo?

Vamos continuar essa conversa e aprofundar ainda mais o conhecimento sobre o setor elétrico!




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