BRR na Arena das Decisões: o elo com Novos Negócios
Nestes mais de 10 anos no Setor Elétrico, tive a oportunidade de participar de movimentos estratégicos relevantes nos grupos econômicos em que trabalhei. Estive presente em processos de re-IPO, em aquisições de concessionárias e, em muitos casos, em análises que resultaram na decisão de não seguir adiante porque o ativo simplesmente não valia a pena. O desafio de analisar uma concessionária no mercado brasileiro que não faz parte do seu grupo é hercúleo — e é justamente nesse ponto que o time de Ativos e BRR (Base de Remuneração Regulatória) assume um papel fundamental.
Como comentei no primeiro post desta série, que busca
aproximar a BRR das demais áreas da concessionária, recentemente tive a
oportunidade de conversar com colegas da equipe de Novos Negócios (NN). Nessas
trocas me reforçaram a visão do quanto essa proximidade pode gerar valor real
para os grupos econômicos, conectando a inteligência regulatória da BRR com a
visão estratégica dos profissionais de NN.
De um lado dessa equação, temos o time de BRR — que se
dedica a seguir o regramento vigente e preservar o valor investido nas
concessões. Do outro, está a equipe de Novos Negócios (NN), em sua busca
incansável por oportunidades de aquisição de ativos estratégicos.
A tese que defendo neste artigo é simples, mas essencial:
valorar uma concessão — especialmente no setor elétrico, mas não se limitando a
ele — sem compreender a fundo sua BRR pode levar a erros significativos, que
impactam diretamente no valor ofertado em um BID. Costumo dizer que valorar uma
empresa sem olhar para sua BRR é como avaliar um imóvel olhando apenas para o
telhado. Por fora pode parecer sólido, mas sem entender o que sustenta a
estrutura, qualquer decisão pode desmoronar.
Em primeira instância, é importante destacar que, após a
revolução da digitalização nos processos de fiscalização liderados pela ANEEL, já comentada em posts anteriores (https://brunosoliveira.blogspot.com/2024/04/revitalizando-regulacao-energetica-as.html),
os valores homologados passaram a ser submetidos a testes e validações
consistentes, reduzindo de forma significativa a margem da discricionariedade
regulatória. Ainda assim, as particularidades da gestão de ativos adotada por
diferentes grupos econômicos tornam complexa a avaliação de oportunidades
relacionadas à BRR.
Concessionárias ou grupos que atuam com focos distintos
tendem a adotar políticas próprias de apropriação de valores em seus
investimentos. Essas diferenças podem se traduzir em oportunidades ou em
riscos nos processos de aquisição. É justamente aqui que o profissional
de BRR pode agregar valor às equipes de Novos Negócios: analisando as
potencialidades, mapeando riscos e contribuindo para que o valuation seja o
mais objetivo e fiel possível à realidade regulatória.
Essa análise passa — mas não se limita — por aspectos como
os métodos de ativação de mão de obra própria, a política e estratégia
tributária aplicada à gestão da BRR, oportunidades de otimização de baixas,
aproveitamento de sobras físicas, das obras em curso (AIC) e a política de
substituição de ativos. Todos esses fatores são drives relevantes para
uma avaliação regulatória que apoie de forma sólida as decisões estratégicas de
aquisição.
Complementando essas análises, temos a projeção da Base de
Remuneração Regulatória (BRR) que, quando bem aplicada, oferece uma visão
consistente de curto, médio e longo prazo. É a partir dela que se constroem
análises de viabilidade mais sólidas, permitindo que Novos Negócios e áreas
estratégicas enxerguem o real potencial de um ativo.
Os principais drives da projeção podem ser
identificados nas informações públicas das concessionárias, tendo como ponto de
partida os últimos valores homologados pela ANEEL. A partir daí, é possível
desenvolver premissas objetivas para a movimentação da base, como:
- participação
do capital de terceiros (obrigações especiais);
- percentual
e evolução de bens totalmente depreciados;
- aproveitamento
de máquinas e equipamentos da distribuição;
- percentuais
médios de depreciação e sua evolução ao longo do tempo;
- relação
entre almoxarifado de operação, terrenos e servidões.
Agregando a essas variáveis os dados dos demonstrativos
financeiros das concessionárias, em especial as movimentações de ativos, é
possível simular a dinâmica do período incremental da BRR. Nessa etapa de
valoração, entram os históricos de reconhecimento regulatório dos
investimentos: a relação entre o Valor Novo de Reposição (VNR) e o Valor
Original Contábil atualizado (VOCa) da concessionária. Mas também é viável
testar cenários alternativos de otimização, correção e alavancagem, dependendo
do perfil do ativo avaliado. Uma leitura rápida no poste https://brunosoliveira.blogspot.com/2024/03/valoracao-de-ativos-um-desafio-diario.html
pode ilustrar como ocorre a valoração dos ativos nos processos de RTP e RTE.
É aqui que a interação entre BRR e Novos Negócios ganha
força. A troca de experiências, percepções de due diligence e informações
fornecidas pela própria concessionária avaliada permitem variar esses drivers e
gerar cenários realistas. Quando esses cenários alimentam os modelos
regulatórios de viabilidade, o resultado é um valuation mais assertivo e
otimizado com menos baseado em “números frios” e mais em inteligência
regulatória aplicada.
Além dessas interações produtivas com as equipes de Novos
Negócios nos processos de potenciais aquisições, o time de BRR também pode
atuar em parceria com as áreas de Relações Institucionais (RI). O papel de RI é
complexo e cheio de nuances — não sou a pessoa mais indicada para detalhá-lo —
mas, de forma simplificada, sua missão é construir pontes com stakeholders,
traduzindo dados técnicos em narrativas estratégicas.
Nesse contexto, a BRR fornece insumos objetivos e
consistentes que fortalecem a argumentação de RI em momentos críticos, como
revisões e reajustes tarifários, audiências públicas ou interações com
investidores. Mais do que números, a BRR ajuda RI a transformar a visão fria do
CAPEX em posicionamentos estratégicos e a converter variações patrimoniais em
informações que sustentam a tomada de decisão.
Considerando tantas oportunidades, fica claro que expandir o
conceito de BRR para além da obrigatoriedade regulatória não é apenas uma
questão de compliance, mas um verdadeiro diferencial competitivo para
empresas que buscam exponencializar seus resultados. O uso inteligente da BRR
torna-se variável decisiva em leilões, processos de M&A e até em IPOs. A
proximidade com as equipes de RI mostra como dados podem se transformar em
estratégia e, resgatando o post anterior, quando vinculamos a visão regulatória
da BRR, os registros gerenciais da controladoria e o olhar de oportunidades
externas das equipes de Novos Negócios, abrimos um novo universo a ser
explorado.
🔜 No próximo post:
"Quando a BRR encontra o planejamento estratégico: investimento, timing
e trade-offs" — vamos refletir sobre o que aconteceria se a BRR
apoiasse a antecipação de gargalos e oportunidades de investimento com mais
precisão do que um plano quinquenal.
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